Corinthians: Folha Salarial Disparada e Adiantamentos Suspeitos Revelados por Auditoria Financeira

Números Alarmantes: O Salto da Folha Salarial e Outras Inconsistências

A cortina se abriu sobre as finanças do Sport Club Corinthians Paulista, revelando um quadro que a atual gestão interina, sob a liderança de Osmar Stabile e Armando Mendonça, qualifica como "desesperador". Um relatório detalhado, acessado com exclusividade pela Gazeta Esportiva, expõe um acréscimo notável na folha de pagamentos do clube e uma série de práticas contábeis questionáveis, herdadas da administração anterior de Augusto Melo.

A despesa mensal com pessoal, englobando todos os colaboradores e não apenas os atletas, apresentou um salto preocupante. Em 2023, o valor girava em torno de R$ 34,7 milhões, já com encargos e pagamentos a Pessoas Jurídicas. Contudo, em 2024, essa cifra disparou para R$ 42 milhões, um aumento de 21% que acende um alerta sobre a sustentabilidade financeira do Alvinegro. Este cenário de gastos crescentes é corroborado pelos dados das Demonstrações Financeiras de 2024, divulgadas oficialmente pelo clube, que apontam um gasto total de R$ 428,6 milhões com "pessoal" no ano passado, R$ 30 milhões a mais do que em 2023. Tal incremento é diretamente associado à política de contratação de mais de 400 funcionários durante o mandato de Augusto Melo, conforme noticiado previamente.

Para ilustrar a escalada dos gastos com pessoal, observe os dados abaixo:

A análise do balancete de fevereiro de 2025 revelou inconsistências contábeis significativas, especialmente nos critérios de apropriação de receitas de TV e royalties da Nike. Cerca de R$ 30 milhões de receita de TV foram registrados como "receita efetiva" em um único mês, quando, na visão da atual gestão, o correto seria diluir o montante ao longo de 12 meses. A mesma metodologia questionável foi aplicada aos royalties da Nike. Essa apropriação distorcida transformaria um superávit de R$ 12 milhões, divulgado em fevereiro, em um déficit de aproximadamente R$ 23 milhões. Além disso, o balancete de fevereiro de 2025 já indicava um aumento de 20% nas despesas de pessoal em relação ao mesmo período de 2024, saltando de R$ 72.877 mil para R$ 87.476 mil.

Desafios na Gestão e a Falta de Transparência

Os problemas financeiros não se limitam apenas à folha de pagamentos. A gestão interina se deparou com uma série de obstáculos operacionais e de transparência. Um montante expressivo de cerca de R$ 60 milhões foi adiantado e lançado como "adiantamentos de fornecedores" sem a devida documentação fiscal. Desse valor, aproximadamente R$ 40 milhões referem-se a direitos de imagem, enquanto os R$ 20 milhões restantes, aparentemente sem contratos que os justifiquem, expõem o clube a riscos fiscais consideráveis. Adicionalmente, adiantamentos de despesas menores, próximas a R$ 1 milhão, relacionadas a jogos, viagens e eventos, também não tiveram a devida prestação de contas.

A ausência de lançamento correto de notas fiscais de produtos da Nike e a falta de registro de despesas com cartões de crédito desde janeiro deste ano são exemplos de falhas que comprometem o controle financeiro. A descontinuidade no lançamento de dados no sistema interno impede a diretoria de ter um fluxo de caixa preciso e de projetar as necessidades financeiras futuras. Mais grave ainda, inexiste qualquer acompanhamento orçamentário mensal para 2026, inviabilizando um planejamento e direcionamento de recursos adequados.

A nova diretoria financeira também identificou pendências urgentes, como a falta de atendimento a demandas dos Conselhos Fiscal, de Orientação e Deliberativo do clube, que, durante a gestão anterior, não obtiveram respostas a diversos pedidos, incluindo o acesso ao contrato do jogador Memphis Depay. Há ainda uma pressão para que sejam atendidas exigências externas ligadas à Apfut, responsável pela gestão do Profut, e a pendências referentes a transações tributárias e ao Regime Centralizado de Execuções (RCE).

A Luta da Gestão Interina: Medidas de Contenção de Danos

Diante do quadro, a diretoria interina, ciente da gravidade, montou uma força-tarefa com o auxílio de aliados para tentar mitigar os prejuízos. A diretoria financeira foi assumida interinamente por Emerson Piovesan, conselheiro vitalício com experiência prévia na função entre 2015 e 2017. Ele conta com o suporte de Rozallah Santoro, que foi diretor financeiro no início da gestão Augusto Melo e, embora tenha recusado um cargo formal, colocou-se à disposição para auxiliar na "apagamento de incêndios" financeiros. Roberto Gavioli, gerente financeiro do Timão desde 2017 que havia deixado o clube na gestão anterior, também retornou para colaborar.

Um relatório de diagnóstico inicial, auditado pela diretoria financeira, propôs medidas emergenciais. Entre elas, destaca-se a negociação direta com a Receita Federal do Brasil (RFB) e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para reestruturar dívidas tributárias, incluindo parcelamentos antigos e impostos não pagos em 2024 e 2025. É crucial mencionar que o clube esteve sob sério risco de exclusão do Profut e do Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos) devido a quatro parcelas em atraso, superando o limite de três. A gestão de Stabile agiu prontamente, quitando cerca de R$ 10 milhões do Perse e regularizando a situação no Profut.

Outras ações incluem a renegociação do contrato de refinanciamento da Neo Química Arena, a implementação de políticas rigorosas de restrição de gastos e a revisão de contratos de patrocínio, bancários e de TV. O objetivo é estabelecer com clareza o volume e a periodicidade dos recursos previstos para o segundo semestre do ano. Uma análise preliminar já indicou a antecipação de aproximadamente 45% do fluxo financeiro de acordos de transmissão e um adiantamento de cerca de R$ 10 milhões do patrocinador máster. Soma-se a isso o comprometimento do fluxo mensal do contrato com a Brax, utilizado para saldar dívidas com o Flamengo (referente à compra de Matheuzinho ), empréstimos bancários e, mais recentemente, a multa pela demissão da comissão técnica de Ramón Díaz, estimada em R$ 16 milhões.

Os dirigentes têm se reunido com agentes envolvidos nesses casos para reorganizar o fluxo de pagamentos, como a reunião entre o vice Armando Mendonça e Igor Zveibrucker, empresário que auxiliou o clube no início do mandato de Augusto Melo. Além disso, o Corinthians buscará atender demandas jurídicas e financeiras específicas para a implementação final dos planos de pagamento de dívidas alocadas junto à CNRD (dívidas esportivas) e ao RCE. A aprovação do RCE é uma das prioridades da diretoria de Stabile nos próximos meses, antes da Assembleia Geral que poderá destituir definitivamente Augusto Melo da presidência.

Em meio à elaboração do relatório, novas necessidades urgentes surgiram. A diretoria, por exemplo, precisou utilizar a cota do Campeonato Paulista de 2025 como garantia para honrar o salário do elenco de junho, estimado em R$ 22 milhões, e quitar outras pendências imediatas.

A Versão da Gestão Anterior: Augusto Melo se Defende

A Gazeta Esportiva buscou o posicionamento da assessoria de Augusto Melo. O presidente afastado, sem se manifestar especificamente sobre os pontos levantados no relatório financeiro, fez críticas contundentes à atual gestão e reiterou seu pedido pela reabertura das contas de 2023. Confira o comunicado na íntegra:

"Esses relatórios e apurações divulgados durante essa gestão interina não condizem com a realidade dos fatos. Em quase um mês à frente do clube, o que se tem visto é uma administração desorganizada, com o Corinthians praticamente abandonado. O reflexo disso é visível: os associados perderam o interesse de frequentar o clube, tamanha a confusão política instalada.

Falar agora em prestação de contas, em adiantamento disso ou daquilo, é totalmente extemporâneo. A hora certa de se analisar contas é no momento da apresentação oficial dos balancetes, como sempre foi feito, e como foi feito na gestão do presidente Augusto Melo. Fora disso, é apenas barulho e tentativa de criar narrativa.

Essa prática de ficar vazando relatórios - feitos às pressas, sem contraditório, e com claros interesses políticos - não só manipula a opinião pública, como prejudica o próprio clube. Tentam denegrir a imagem de Augusto Melo, mas o que fazem, na prática, é prejudicar o Corinthians em todas as áreas: financeira, administrativa e institucional.

Até um mês atrás, com Augusto na presidência, não havia atrasos de pagamento e as contas estavam equilibradas. Agora, o que vemos é uma gestão despreparada, sem capacidade de gerar receita, sem articulação para trazer investimentos, e que tenta se justificar espalhando relatórios internos para imprensa como se isso fosse prova de algo.

Não é. Isso é apenas a versão de quem hoje ocupa o cargo tentando construir uma narrativa para esconder sua incompetência e incapacidade de gestão.

Quem vai julgar se as contas estão corretas ou não é o Conselho Fiscal, o Conselho Deliberativo e, no momento apropriado, os órgãos competentes do clube, dentro do prazo e dos mecanismos estatutários.

Até lá, o que se espera de quem está no poder é trabalho, resultado e responsabilidade institucional. Não fofoca.

Inclusive, quem está no poder deve fazer o processo de reabertura de contas de 2023 para que seja explicado todos os valores que quiseram colocar no balanço de 2024. Só assim se mostrará a realidade das finanças do Corinthians ."

A assessoria do Corinthians foi procurada para comentar o assunto, mas optou por não se manifestar até o momento da publicação desta reportagem.