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Corinthians: Auditoria Revela Desvios Milionários de Materiais Nike e Aponta Vice-Presidente

Por Redação FuTimão em 17/11/2025 04:18

Uma profunda investigação interna no Sport Club Corinthians Paulista trouxe à tona um cenário alarmante de descontrole e supostas irregularidades na administração dos materiais esportivos fornecidos pela Nike. O relatório de auditoria, ao qual tivemos acesso, revela que o volume de itens retirados superou em quase 300% a cota anual estabelecida em contrato, enquanto, paradoxalmente, as categorias de base e outras modalidades esportivas enfrentam a escassez, utilizando uniformes em condições precárias ou sequer recebendo os equipamentos necessários.

Este levantamento detalhado identificou sete ocorrências classificadas como de alta gravidade, que pintam um quadro preocupante da gestão interna do clube. Entre os problemas mais notáveis, destacam-se o acúmulo de coleções antigas sem destinação clara, a falta de distribuição adequada de uniformes a diversos departamentos, e a ausência de um inventário físico formal no almoxarifado do Parque São Jorge por mais de quatro anos.

Adicionalmente, foram constatadas notas fiscais de recebimento não registradas no sistema, gerando inconsistências contábeis e expondo o clube a riscos fiscais. A auditoria também apontou uma distribuição desigual de uniformes entre diretores, funcionários e atletas, em conjunto com uma carência de planejamento nos pedidos à fornecedora. Mais grave ainda, identificou-se a retirada de materiais antes da conclusão dos fluxos de aprovação e por solicitantes indevidos, enfraquecendo significativamente os controles internos e a rastreabilidade.

A Gestão de Materiais Sob Escrutínio: Descontrole e Excedentes Absurdos

No centro de parte dessas anomalias, o relatório posiciona o vice-presidente Armando Mendonça, encarregado da administração dos materiais desde maio do corrente ano. Ele é apontado por ações como a retirada direta de itens sem registro ou autorização prévia. O documento descreve que o dirigente expressou "tom de preocupação em relação ao andamento dos trabalhos de auditoria" e utilizou "expressões de natureza agressiva e alusões interpretadas como ameaças" em diálogos com Marcelo Munhoes, diretor de Tecnologia do Corinthians e líder da investigação.

Os números apresentados pela auditoria são contundentes. O Corinthians obteve da Nike 41.963 itens em 2025, até 10 de outubro, um volume 24% superior ao registrado em todo o ano anterior (33.902 produtos). Somando os materiais recebidos nestes dois anos, o valor totaliza R$ 23.772.090,37. Este montante excede em R$ 15.772.090,37 o limite contratual de R$ 4 milhões anuais, representando um excedente de aproximadamente 297% no período analisado. É importante ressaltar que a Nike não cobra pelos itens adicionais solicitados.

Dados de Recebimento de Materiais Nike (2024-2025)
Período Itens Recebidos Valor Estimado
Ano 2024 33.902 Não especificado individualmente
Ano 2025 (até 10 de out.) 41.963 Não especificado individualmente
Total (2024-2025) 75.865 R$ 23.772.090,37
Cota Contratual Anual - R$ 4.000.000,00
Excedente do Período - R$ 15.772.090,37 (297%)

A Dicotomia do Parque São Jorge: Fartura no Topo, Carência na Base

Apesar da impressionante quantidade de materiais recebidos, a auditoria revelou que a "grande maioria das modalidades esportivas do clube não foi contemplada pela uniformização oficial da fornecedora". Departamentos essenciais não recebem as quantidades necessárias para treinos, viagens e competições. Representantes de esportes aquáticos, por exemplo, estão sem uniformes oficiais.

Para agravar a situação, o clube tem adquirido materiais esportivos licenciados, com um custo de R$ 776 mil por 13.503 itens, para suprir modalidades como futsal e basquete de base. Esta prática é apontada como geradora de custos desnecessários, visto que os fornecimentos da Nike não implicam despesas ao Corinthians .

Nas categorias de base, apenas o time sub-20 recebeu uniformes de treino completos da coleção 2025. Os demais times não foram adequadamente contemplados, sendo inclusive orientados a "racionar o uso dos materiais esportivos sob a justificativa de que não haveria quantidade suficiente para atender às demandas da Copa São Paulo de Futebol Júnior". As divisões inferiores, como sub-12 e sub-13, utilizam modelos de 2019 para treinamento e de 2021 para jogos. A situação do futsal é crítica, com uniformes "apresentando desgaste acentuado pelo tempo e utilização prolongada, além de costuras, remendos, rasgos e desbotamento da malha".

O descontrole na gestão dos itens também se manifesta no montante de R$ 6,4 milhões em notas fiscais não lançadas no sistema do clube nos anos de 2024 e 2025. O relatório enfatiza que "o não lançamento de notas fiscais no sistema constitui não conformidade grave, comprometendo o controle interno e fluxo de informações a acuracidade dos saldos sistêmicos dos materiais e riscos de exposição fiscal".

Até o futebol profissional masculino foi afetado. O relatório destaca um episódio em que o Corinthians precisou alterar o uniforme para uma partida contra o Fluminense, no Maracanã, pelo Campeonato Brasileiro, devido à falta de camisas em estoque. Às vésperas do jogo, em 13 de setembro, o clube percebeu a insuficiência de camisas brancas, e a Nike não conseguiria entregar a tempo. O Corinthians solicitou e obteve permissão do Fluminense para que ambas as equipes utilizassem seus segundos uniformes.

O Vice-Presidente no Epicentro das Controvérsias

O vice-presidente Armando Mendonça, que assumiu a responsabilidade pela gestão dos materiais esportivos em maio, é reiteradamente mencionado no relatório por ações consideradas inconsistentes. A auditoria verificou que, rotineiramente, são solicitadas de seis a onze camisas adicionais por jogo, em nome da rouparia, para "relacionamento da diretoria", tendo o vice-presidente como principal destinatário.

Em um caso específico, Armando Mendonça teria solicitado para si as 19 camisas especiais remanescentes da partida contra o Palmeiras, em 31 de agosto, que ostentavam patches da NFL. Ao tomar conhecimento de que a auditoria estava ciente, o vice-presidente cancelou o pedido, mas posteriormente retirou oito peças, "sem a devida formalização do processo de solicitação no sistema".

Uma inspeção na rouparia do CT revelou que o dirigente "realizou retiradas diretas de materiais esportivos pertencentes à rouparia, sob a alegação de empréstimo temporário, sem registro formal ou autorização prévia". Entre 6 de junho e 30 de outubro de 2025, o vice-presidente retirou 131 itens, sem incluir as camisas destinadas a "relacionamento" em dias de jogo, e algumas dessas retiradas ocorreram sem a devida formalização documental. O relatório ainda aponta que ele ordenou a transferência de materiais considerados insatisfatórios do CT para o almoxarifado do Parque São Jorge, "sem a emissão de qualquer documento fiscal ou contábil que respaldasse a transferência".

Durante a investigação, o relatório descreve duas conversas entre o vice-presidente e Marcelo Munhoes, diretor de Tecnologia e responsável pela auditoria, nas quais Mendonça "demonstrou tom de preocupação em relação ao andamento dos trabalhos". Em um desses encontros, "o diálogo assumiu caráter mais incisivo, com expressões de natureza agressiva e alusões interpretadas como ameaças, dirigidas ao auditor". Em outra ocasião, Armando Mendonça teria entrado sem ser convidado em uma reunião com o representante da Nike, "formulava perguntas e respondia-as ele próprio, gerando constrangimento e intimidação aos demais presentes".

A Versão do Dirigente: Defesa e Contestações

Em resposta às questões levantadas, o vice-presidente Armando Mendonça contestou as informações da auditoria. Ele afirmou ser falsa a alegação de que é responsável pelas diretrizes de distribuição dos materiais da Nike e pela administração dos almoxarifados do Corinthians . Mendonça declarou que, diante do "caos" encontrado em junho, quando a gestão não realizava o controle necessário e a cota anual de 2025 já havia sido excedida, ele pessoalmente se envolveu para auxiliar no sistema de aprovações de retirada, buscando maior transparência e controle do patrimônio do clube e a prevenção de irregularidades.

O dirigente acrescentou que tem solicitado constantemente melhorias no sistema de controle de retirada de materiais da Nike. Ele ressaltou que a definição da política de distribuição interna por departamento não é e nunca foi sua responsabilidade, sendo esta uma atribuição geralmente anual. Sua função, segundo ele, é analisar e autorizar pedidos extras conforme as necessidades, em conjunto com o departamento administrativo. Mendonça expressou profundo pesar por informações que considera "desconectadas da verdade e desamparada de qualquer material probatório", e garantiu que sempre apoiará melhorias, maior controle e a apuração correta de irregularidades.

Sobre as retiradas diretas de materiais, Mendonça explicou que o Corinthians utiliza uma quantidade mínima de itens para ações de relacionamento com outras agremiações, patrocinadores e figuras importantes do futebol brasileiro, e que todos os pedidos são encaminhados por e-mail e formalmente registrados internamente. Ele classificou o relatório como "tendencioso" e contrário ao profissionalismo que busca implementar no clube. Quanto à suposta interferência na investigação, o vice-presidente negou a acusação, afirmando que "internamente, tenho discordâncias em relação a processos do clube, o que é normal dentro de uma gestão", e que "nunca houve falta de respeito da minha parte, essa foi uma das razões para que eu entrasse com uma notificação extrajudicial".

Comercialização Ilícita e as Consequências da Investigação

Uma denúncia anônima levou a auditoria a descobrir a comercialização clandestina de materiais do clube, tanto dentro quanto fora de suas instalações. Funcionários do Corinthians estariam intermediando a venda de produtos Nike provenientes do estoque institucional, fato que foi comprovado. Um funcionário, não identificado no relatório, foi flagrado vendendo materiais desviados por valores entre R$ 150,00 e R$ 180,00 por peça e reconheceu sua participação no esquema.

Nas considerações finais, a auditoria concluiu ter identificado "falhas processuais relevantes nos controles de armazenamento e na destinação de materiais esportivos Nike, além de fragilidades nos fluxos de aprovação e na rastreabilidade das solicitações". O relatório apurou a existência de "processos não conformes, como retiradas de materiais antes da conclusão dos trâmites formais, ausência de registros sistêmicos completos, e suspeitas de comercialização indevida de itens pertencentes ao clube, algumas delas com indícios de envolvimento de colaboradores".

Apesar da "expressiva quantidade de materiais esportivos que o clube recebe anualmente da Nike, atingindo patamares significativamente superiores ao previsto contratualmente", somados aos uniformes licenciados adquiridos pelo próprio Corinthians , "verificou-se que diversas modalidades esportivas do clube permanecem sem a devida uniformização, revelando uma distribuição desigual e ineficiente dos recursos disponibilizados". O relatório finalizou com 17 recomendações para aprimorar os processos internos. Cópias do documento foram entregues ao presidente Osmar Stabile, que solicitou a investigação, ao presidente do Conselho Deliberativo, Romeu Tuma Júnior, e à Polícia Civil, que já conduz um inquérito criminal sobre o assunto.

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